
Encontrámos uma entrevista feita a 7 de Março de 2005 a esta sublime actriz pelo site
www.canallagos.com , quando tinha 77 anos, que publicamos a seguir .
''Canal Lagos – Senhora Dona Eunice, como é que vê o teatro de hoje como elemento de formação cultural? Continua a ter o mesmo papel ou considera que houve algum esvaziamento?
Eunice Muñoz – Isso vai ser eterno. O Teatro terá sempre essa missão, mais do que qualquer outra.
CL – Dá-nos ideia que o Teatro tem vindo a perder adesão. Estamos enganados?
EM – Eu acho que está, porque as novas gerações estão profundamente interessadas pelo Teatro.
CL – Como é que o Teatro está a conseguir que as faixas etárias mais jovens estejam a aderir?
EM – Que eu me lembre, pelo menos desde 1986, os espectáculos em que participei, tinham na sua audiência uma grande quantidade de jovens. Quando naquele ano interpretei a Mãe Coragem, estivemos em cena durante meses, sempre com casas cheias e com uma participação de jovens da ordem dos 70%. Em seguida fiz outra peça no Teatro da Trindade em que era impressionante ver a quantidade de jovens que acorriam a esse espectáculo. E mesmo todos os espectáculos do Dona Maria, contaram sempre com muita audiência jovem.
CL – Se tivesse que regulamentar ou recomendar algo que viesse enriquecer a sua arte, quais seriam essas recomendações?
EM – O mais importante é a paixão que tivermos pelo Teatro. O resto vem por arrasto.
CL – Embora não seja a área em que tenha actuado, como é que explica que o Teatro de Revista tenha vindo a perder velocidade e iniciativa?
EM – Aconteceu que hoje se pode dizer tudo e antigamente isso não era possível. O segredo e o interesse da Revista, estavam nas entrelinhas. Essas entrelinhas desapareceram e o interesse viu-se diminuído.
CL – Se tivesse que distinguir hoje dois ou três actores ou personalidades que influenciaram de forma intensa o teatro, quem apontaria?
EM – A Cármen Dolores, a Irene Cruz e jovens como a Margarida Marinho e muitos, muitos outros. Não há crise de talentos, não há crise de teatro nem crise de público. É evidente que se não pode exigir duma jovem actriz, aquilo que exigiremos daqui a 10 ou 15 anos. E não é fácil para os jovens, porque eles estão sempre na corda bamba, porque as oportunidades não aparecem com facilidade.
CL – Um actor é mal remunerado?
EM – Ganha, ganha (grande gargalhada), ganha muito menos do que você imagina. A televisão efectivamente paga melhor, mas o teatro não. O salários no teatro são muito modestos. Eu, por exemplo, saí do Dona Maria a ganhar cerca trezentos e tal contos.
CL – Senhora Dona Eunice, nós somos do tempo do Teatro Monumental, do Toni dos Bifes, onde se concentravam muitos actores e para nós naquela época, ir comer um bife ao Toni, era um dia muito especial. Tudo isto para dizermos que naquele tempo, o grande empresário era o Vasco Morgado e para perguntarmos quem é que distinguiria no campo empresarial?
EM – Hoje, praticamente não temos grandes empresários. O único, não subsidiado, é o do Maria Vitória.
CL – E como é que classifica o La Féria?
EM – É um caso muito especial. É um homem raro, com uma capacidade enorme de fazer espectáculos que são atractivos para o público e deslumbrantes. É um homem com uma noção de ritmo fantástica e acima de tudo, um homem muito corajoso, porque vive da bilheteira. Eu tenho a maior admiração por ele. O último trabalho que fiz com ele e com o Rui de Carvalho, foi a Casa do Lago, e foi uma experiência muito agradável. Estivemos mais de 6 meses em cena e sempre cheios.
CL – Depois de uma vida quase inteiramente dedicada ao teatro, que avaliação faz?
EM – Não sei bem que avaliação devo fazer. A minha vida tem sido tão dividida……Acho que fiz aquilo que devia fazer.
CL – Voltava a fazer o mesmo, o que aliás se lê no seu sorriso….
EM – Certamente que sim. Eu sempre fui sincera e em tudo o que fiz na minha vida fui verdadeira.
CL – O que é que recomenda aos “carolas” locais que, muitas vezes com parcos recursos, não desistem de tentar fazer teatro?
EM – Olhe, que gostem muito do que estão a fazer.
CL – Nós, pela nossa parte, gostámos muito de estar aqui, de vê-la e fazemos votos para que mantenha esse sorriso por muitos anos, a contar-nos histórias e fundamentalmente, a fazer teatro. Bem haja. ''
O Canal Lagos comentou sobre a entrevista que ' surpreendeu-nos a forma modesta como se apresentou e a timidez que era patente e de que Ela confessou ter dificuldade em libertar-se.'
O que mais sobressaiu nesta entrevista, na nossa opinião, foi o amor ao teatro e representação de Eunice , que se nota perfeitamente em cada resposta que dá .